10 de julho de 2009

CARTA ABERTA DE EULÁLIO LEANDRO

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O texto a seguir é de autoria do membro do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias,Eulálio Leandro, e é uma crítica ao livro recentemente publicado pela profesora Jordânia Maria Pessoa, Entre a tradição e a Modernidade: a Belle Époque Caxiense. O espaço do Blog do Renato está aberto, caso a autora queira responder às críticas.



CARTA ABERTA

Exmo Sr Presidente do Instituto Histórico Geográfico de Caxias – MA
MD Desembargador Arthur de Almada Lima Filho

Os equívocos da tese: ENTRE A TRADIÇÃO E A MODERNIDADE: A BELLA ÉPOQUE CAXIENSE

O título da tese é sugestivo e convida para uma leitura histórica sobre a cidade de Caxias, mas os equívocos merecem um posicionamento pelos historiadores e estudiosos sobre a cidade fabril.

Teceremos alguns comentários: a obra registra uma distância de São Luis a Caxias de 430 km (p. 19) dever-se-ia ler, aproximadamente 330 km. É lamentável que uma professora de História da Universidade Estadual do Maranhão, campus Caxias, fosse ludibriada pelo guia turístico que querendo abreviar o seu trabalho, mostrou uma antiga fábrica de tecido no Centro da cidade, hoje, transformado no centro cultural de Caxias. O correto seria “o antigo edifício da fábrica de tecido União Caxiense foi demolido, restando apenas a chaminé, e sobre o escombro foi erigido o Centro de Ensino Médio Aluisio de Azevedo localizado no bairro do Ponte”.

Na página 53, a tese registra “que uma das fábricas do bairro do Ponte foi edificada a uma distância de 5 km da cidade” esse equivoco de distância pode ser corrigido sem muito trabalho acadêmico.

Na página 20: “visitei as suas praças e os respectivos monumentos erigidos aos seus filhos ilustres – Coelho Neto, Gonçalves Dias e tantos outros”. Se houvesse um pouco mais de respeito pelos valores humanísticos da cidade, diria assim: “visitei o Panteon Caxiense e lá encontrei os bustos do poeta Gonçalves Dias, do prosador Coelho Neto, do médico e historiador Cesar Marques, do poeta e industrial Dias Carneiro e do poeta Vespasiano Ramos. Estes últimos três nomes não podem ser tratados como “os outros”. O Panteon Caxiense é o mais rico e fecundo do Brasil e é o mais esquecido e ignorado até mesmo pela elite acadêmica do Morro do Alecrim.

Outro aspecto que a tese desconsiderou foi a fundação da cidade pelos padres Jesuítas. Foram eles que criaram a matriz humanística cristã da Velha Aldeias Altas, transportaram os valores da renascença para o aldeamento, como a música, a dança, o teatro religioso, o latim, a língua portuguesa, e por outro lado, inseriram uma verdadeira revolução agrícola quando introduziram a metalurgia para transformar o ferro em arado, faca, facão, machado, todos foram usados em beneficio do índio na agricultura para produzir alimentos e algodão para vestir o índio, agora já civilizado. Foram os jesuítas que primeiro introduziram o gado, a pecuária para poder oferecer uma boa dieta para o índio aldeão. Foram pioneiros na qualificação dos índios quando ensinaram tais ofícios: oleiro, carpinteiro, funileiro, alfaiate, costureiro, marceneiro e também a alfabetização.

Na página 27, registra o ressurgimento da cidade em torno das fábricas têxtil. Há um equivoco muito grande quando afirma que houve um ordenamento da cidade de Caxias em torno das fábricas, pelo contrário, assim como em São Luis, as fábricas se instalaram na periferia da Cidade em face da facilidade da mão de obra existente. O sitio urbano da cidade permaneceu inalterado, somente no século XX dos anos 30, o interventor federal promoveu uma mudança urbanística na cidade de Caxias.

Na página 23, observa-se um gritante equivoco: “a Companhia de Comércio do Grão-Pará, fundada pelos portugueses para explorar as potencialidades da região”, a afirmação correta seria: “a Companhia criada por Marquês de Pombal, em 1755, objetivava integrar economicamente o antigo Estado do Grão-Pará e Maranhão no Império Colonial Português. O Maranhão de hoje era chamado Capitania do maranhão que integrava também o Piauí, a Companhia não foi criada apenas para explorar a região de Aldeias Altas, como afirma na tese.

Na página 31, está escrito: “a criação da Companhia de Comércio fundado em 1775”. A referida Companhia foi fundada em 1755 e sobreviveu mais 20 anos quando termina o monopólio e com isso a Companhia finda a sua existência.

Na página 32, há um equivoco de data na citação que a mestranda faz. O Arraial de Aldeias Altas passou a ser denominada Vila da Nova Caxias em 1804, e não a data citada na tese: “1812”.

Nesse período Jacob Gorender em sua obra Escravismo Colonial, registra a maior concentração de escravos do Brasil chegando a 86% da população de Caxias.

A tese informa que houve uma mudança de padrões culturais na virada do século XIX. É um profundo engano da mestra. A grande mudança em todos os aspectos da vida da cidade começa a partir da primeira década do século XIX quando foi assinado o tratado de comércio em 1810, entre Portugal e Inglaterra, que abriu os portos brasileiros às nações amigas, e por extensão, o porto maranhense passou a receber navios de várias nacionalidades que abarrotaram o comércio maranhense de manufaturas e uma parte dos ganhos da aristocracia rural foi drenada com supérfluos, tais como: cachão de defuntos, doces, biscoitos, conservas, tecidos finos, trigos, jóias, bebidas e outros. Caxias por ser a região mais rica da província do Maranhão incorporou muito bem esta mudança de hábitos. A aristocracia rural contraditoriamente se fechava para a modernidade tecnológica produzida pela revolução industrial, com isso perdia a competitividade dos seus principais produtos agrícolas.

Na virada do século XIX, a tese não contempla a inclusão social e econômica de um segmento das camadas populares, um contingente de mulheres trabalhadoras das fábricas de tecidos.

A tese não faz nenhum registro sobre a mudança de hábitos e costumes das camadas populares. O surgimento em Caxias e em todo o Brasil, do futebol. Os times de futebol emergem e proporcionam grandes espetáculos regados a banda de música e torcidas.

Na segunda metade do século XIX, em Caxias, a elite caxiense fala e escreve em francês, ler jornais em francês que circula em Caxias, surge a imprensa, surge o jornal mais debatido no meio social: “O Observador” que passa a integrar a imprensa periodicamente, a sociedade ler os melhores clássicos que estão sendo lidos na Europa, participa de saraus literários, bailes familiares onde se dançava a valsa, a polca polaca, a quadrilha de salão ao som de um bom piano. A música italiana é interpretada por Verdi, Bellini e Donizete os maiores cantores da Europa.

Foi nesse período que surgiu o teatro Harmonia em 1843, onde Gonçalves Dias recitava quando ia a Caxias e também surge nesse período o Casino Caxiense, o lugar onde foi oferecido um baile ao poeta Gonçalves Dias quando esteve pela última vez em Caxias.

Na segunda metade do século XIX, sobre a cidade de Caxias, afloram demasiados equívocos e considerações que a tese não privilegiou. Enquanto o Maranhão estava mergulhado em uma profunda crise, econômica, moral e social, a cidade de Caxias estava em plena prosperidade agrícola e comercial. O caso Caxias merece destaque por que enquanto a província estava em crise, a cidade de Caxias continuava sendo portentosa no comércio e na agricultura, os engenhos de açúcar tomavam espaço na plantação de algodão e os municípios vizinhos seguiam a velha Caxias, produzindo para o mercado regional.

O almanaque maranhense de 1861 registra uma Caxias com 20.000 habitantes livres, no entanto nas páginas 55, a mestra registra no inicio do século XX, “746 casas cobertas de telhas e grande numero de casas de palha aos seus arredores”. Esses números conflitam com os dados do almanaque. Nesse caso Caxias sofreu uma redução de habitação, e consequentemente a cidade.

Ainda o almanaque registra: 83 casas de negócios secos e molhados e fazenda, 11 pequenas casas de comércio, 24 armazéns de legumes, 47 proprietários e capitalistas, 81 engenhos de açúcar e aguardente, 110 fazendeiros de arroz e farinha, 60 proprietários de fazendas. As 60 fazendas de gados detinham 10.000 cabeças de gado e produzia 3.000 bezerros por ano. O número de ourives de Caxias era de 21, superando o numero existente em São Luis, capital da província.

O presidente da província Eduardo Olimpio Machado em um dos seus relatórios profetizava a diminuição de Caxias como empório comercial do sertão, afirmava o então presidente da época: “ a navegação a vapor pelo rio Parnaíba e a transferência da capital da província do Piauí para a Vila Poty – hoje Teresina. Estavam certas as preocupações de Olimpio Machado por que o fato se materializou e alcança os dias atuais.

Caxias na segunda metade do século XIX estava em pleno desenvolvimento e a sua produção já estava sendo direcionado para o mercado regional. A leitura da tese nesse período foi superficial e precipitada

A tese enaltece a elite por construir “A BELLE ÉPOQUE CAXIENSE”. Observa-se na tese uma visão conservadora da história ao excluir a participação popular na construção de uma Caxias liberal e fabril. A edificação dos prédios fabris e a compra do maquinário e os funcionamento das fábricas foi graças a venda de ações na praça de Caxias, ao otimismo do povo de Caxias de diversos segmentos sociais que se empenharam para serem acionistas.

Também as companhias de água, companhia a vapor e outras, a participação popular na aquisição de ações, foi capaz de dinamizar essas companhias.

Profª Jordana Maria Pessoa, por incrível que possa parecer na sua tese. a mulher não foi enaltecida pelo seu valor na sociedade, e a mulher caxiense nessa época, principalmente oriunda das camadas populares foi a força motriz que movimentou os teares das fabricas de tecidos. Tanto as mulheres abastadas que compraram ações e as mulheres pobres que vendera a sua força de trabalho, sem elas não teria havido a Caxias fabril.

Não querendo quebrar a hierarquia acadêmica, eu - na qualidade de historiador me coloco a disposição de um debate público sobre os equívocos da tese.

Deixo como sugestão para os mestrandos e doutorandos de Caxias, a tese: “A BELLE EPOQUE CAXIENSE DOS INCLUÍDOS SOCIAL E ECONOMICAMENTE NA VIRADA DO SÉCULO XIX”. (as mulheres trabalhadoras das fábricas, lenhadores, foguistas, as jovens e os trabalhadores)


Eulalio Leandro
Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias

16 comentários to “CARTA ABERTA DE EULÁLIO LEANDRO”

  • julho 10, 2009 5:52 da tarde
    Anónimo says:

    Alguma coisa acontece. Ou a professora viajou na maionese, ou o professor tá pirado de emoção. Espero que a professora apresente a antítese das constatações do professor.

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  • julho 11, 2009 10:33 da manhã
    Anónimo says:

    Creio que a professora Jordânia de pronto responderiaa uma crítica acadêmica, mas dificilmente responderá a esse desaforo - diga-se de passagem - mal escrito.

    A quem não leu o livro da professora,sugiro e leitura e o seguinte exercício: procurar os equívocos de Eulálio Leandro ao querer apontar os equívocos de Jordânia, além de engraçado, será surpreendente.

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  • julho 11, 2009 11:36 da manhã
    Anónimo says:

    Ora, como não responder, ainda mais quando a vossa senhoria, a professora, tem tanta certeza dos equívocos do professor Leandro. Um debate é sempre salutar, mesmo os que se enroscam ao chão.

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  • julho 12, 2009 10:17 da manhã
    Anónimo says:

    Não sei. Acho que quem devia responder era o MD Desembargador Arthur Almada Lima, a carta é aberta, mas é endereçada a ele, né não?

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  • julho 13, 2009 7:17 da tarde
    jhosihel says:

    Acho que a professora não deve perder tempo respondendo a esse desaforo. Ateh porque...
    cachão de defuntos?? (talvez na época não se conhecesse a palavra CAIXÃO)KKK; E "A força motriz que movimentava"?( talvez soh movimentasse naquela época); E "as mulheres pobres que vendera sua força"? ( se fosse venderam, eu acreditaria).

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  • julho 13, 2009 7:27 da tarde
    jhosihel says:

    vejam soh como as coisas concordam no texto desse "professor"
    "As 60 fazendas de gados detinham 10.000 cabeças de gado e produzia 3.000 bezerros por ano". ( as fazendas DETINHAM, mas as fazendas PRODUZIA 3.000 bezerros" Professor, uma aula de português instrumental não lhe faria mal.

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  • julho 14, 2009 8:39 da manhã
    Anónimo says:

    Não maltrate tanto assim Josi. Bem no fundo o professor tem lá suas razões. O livro traz pequenos equívocos históricos, nada que o invalide.

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  • julho 14, 2009 7:41 da tarde
    Isaac Rehl says:

    Na verdade, de tudo o que foi rabiscado ali, a única "correção" que tem alguma relevância é a da localização da Fábrica. Não chega a ser um lapso que comprometa o argumento da mestra, posto que sua pesquisa é sobre padrões culturais - não sobre geografia do espaço urbano -, e para padrões culturais (que são construções simbólicas), se um edifício está um quilômetro mais pra lá ou pra cá, isso é de pouca monta. Importa, sim, o significado social deste edifício no imaginário coletivo. Mas, se tal erro existe, ele merece uma correção; porém, por mera formalidade.

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  • julho 14, 2009 7:45 da tarde

    Quanto aos erros de Eulálio aos quais Jhosihel se refere, estes que ele apontou são apenas a ponta do iceberg. Aqui está a diferença entre estudiosos e estudadores: os primeiros podem até cometer erros superficiais, posto que humanos, mas as verdades profundas são salvaguardadas; para os segundos só a superfície importa, e, mesmo nela, eles erram.

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  • Este comentário foi removido pelo autor.
    julho 14, 2009 7:45 da tarde

    Este comentário foi removido pelo autor.

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  • julho 14, 2009 7:51 da tarde

    Há um artigo sobre a pretensa crítica de Eulálio, em que tais erros devem ser discutidos, que eu estou pensando se escrevo ou não, se vale a pena o trabalho. Mas, por enquanto, sobre charlatanismo intelectual, sugiro a leitura de um pequeno ensaio meu na página da Causthica revista Cultural (www.causthica.net). Chama-se "Sobre Saber e Escrever".

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  • julho 15, 2009 7:04 da manhã
    Anónimo says:

    Credito que mesmo com os erros de português do sr. Eulálioe em sua crítica, a tese da professora Jordania deve ser revisada e corrigida, pois se trata de um trabalho acadêmico e será fonte de pesquisa para os jovens estudantes não só acadêmicos de história como de outras áreas que necessitem buscar conhecimentos da nossa história, pois é sabido e verídico que aqui em Caxias as fontes de pequisas são poucas ou quase inesistentes, talvez tenha ocorrido neste erro a professora em não ido beber em outras fontes.

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  • julho 15, 2009 10:25 da manhã
    Anónimo says:

    De tudo que já ouvi falar sobre o livro da professora observei que muitas pessoas estão preocupadas, apenas em deventer a professora ou atacar os erros de ortograficos do critico literário.Deixando em segundo plano o que realmente importa, ou seja, analisar aquela produção científica que na medida que é lançada ao público o autor perde o seu domínio e as leitores cabe realmente discutí-la. Prescisamos saber qual é a função social dessa obra para a história local. para os estudantes em geral. Se tem erros muito nobre a contribuição do então cristico, cabe a autora reconhecê-los e tomar as providências, uma errata por exemplo. Deixemos de trazer esse debate para o âmbito pessal e fazamos uma análise com maturidade e responsabilidade acadêmica, pois é essa a função primordial de quem escreve e de quem critica.

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  • julho 15, 2009 11:16 da manhã
    Pedro Sá says:

    Muito bom anônimo, você foi no cerne da questão, bem na pinguela. O livro é bom, mas tem alguns pequenos equívocos; por outro lado tem de se levar em consideração a crítica do professor, mesmo que mal escrita.Os acadêmicos não precisam ficar nervosos.

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  • julho 15, 2009 11:43 da manhã
    jhosihel says:

    Cada vez que vejo o pluralismo de idéias presente em qualquer questão que se discuta, sinto-me desestimulado a abandonar a nossa luta. Um dia veremos esse país lendo, escrevendo e debatendo.

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  • julho 16, 2009 8:36 da manhã
    Anónimo says:

    Caxias é uma cidade que sofre pela omissão. Muitas coisas danosas a nossa história, ao nosso patrimônio histórico a nossa identidade e poucos são os que têm coragem de falar ou fazer alguma coisa. Eulálio não é digno de criticas ou elogios pelo que fez ao analisar a recente obra lançada ao público caxiense, ele cumpriu sua função enquanto membro do Instituto Histórico Caxiense. Essas instituições devem realmente se manifestar frente a qualquer obra que se refere a Histórica da cidade. Que pena que ainda a maioria dos membros e intelectuais caxienses, não incorporam esses espírito de se preocuparem mais com o interesse da sociedade, ou das futuras gerações que haverão de ler as obras hoje escritas e ficam mais preocupados em defender o interesse do amigo ou criticar o desafeto. Eu por exemplo prefiro fazer com disse Sócrates: “Prefiro ser amigo da verdade que amigo de Platão”

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